quarta-feira, 21 de março de 2012
meninas de cabelos selvagens, por que insistem tanto em fazê-los parecerem fios de milho? Melhor seriam se fossem fios-de-ovos. Que, parasitas, invadem meu coração.
segunda-feira, 12 de março de 2012
Conto da Descoberta do Homem
A chama do isqueiro deu mais expressão aos nossos rostos imersos naquele lugar à meia-luz.
Acendi o cigarro amassado que repousava em minha boca, tragando tão profundamente a fumaça que, quando a soltei, envolveu as duas mulheres do outro lado da mesa, que conversavam incessavelmente. Eram belas talvez demais para este velho gato.
Aquela da esquerda, Anna Paula, ergueu sua caneca pesada e tomou um gole do restante de cerveja que ainda havia lá, provavelmente quente e sem gás. Imaginei o gosto que aquilo produzia e tive vontade de conhecê-lo naquela boca cigana. Anna era, sem dúvida, a mais atraente dentre as duas. Traguei mais uma vez meu cigarro. Toda minha atenção sexual se voltava à ela. Reparei em suas sobrancelhas negras esticadas no rosto, que a conferiam um olhar furtivo e sedutor; não tive dúvidas de sua descendência latino-espanhola; Percorri meus olhos em seus cabelos desfiados, que escorriam bagunçados em seus ombros, numa demonstração de sua selvageria. Sua boca era perfeitamente desenhada e avolumada; os lábios estavam molhados da cerveja e contornavam seus dentes grandes e brancos.
(Mas que a beleza infindável daquele corpo me perdoe, o que nela me despertava tanta atenção eram as saboneteiras que repousavam em seus ombros. Só os poetas entenderão os profundos desejos que despertam em um homem duas saboneteiras bem-feitas.)
Embora desejasse percorrer cada centímetro de Anna Paula, a verdade é que, de alguma forma que eu não compreendia, me sentia completamente devoto à Camila. Ela escutava com atenção sua amiga falar alto, despejando sensualidade sobre sua meiguice. E mesmo que a conversa não a deixasse totalmente a vontade, tinha um sorriso quase preso no rosto e olhos atenciosos. Quem sabe fossem os olhos. Ela também, de tempo em tempo, me dirigia um olhar carinhoso que eu sentia dizer que me queria muito bem. Era descendente de irlandeses e talvez por isso tinha as bochechas rosadas. Ou talvez tivesse bebido demais. Mas eu recusava pensar naquela mulher tragando qualquer diabo. Se nela houvesse guardado algum escárnio ou maldizer, tenho certeza de que estes voltariam em formas puras como versos de uma amiga trovadora e devota. Tudo que eu pensava é que tinha em Camila uma mulher inalcançável que esbanjava tesouros; com seu jeito nórdico mas acolhedor: olhos que, com sua imensa ternura, me guardavam uma armadilha. Era impossível ficado ao lado dela sem se sentir fisgado. Não tive dúvida de que eram os olhos...
E quem diria, um gato velho e perdido como eu, tinha defronte a mim a imagem de uma mulher completa e endeusada. Anna Paula e Camila me lançavam olhares e eu compreendia. Compreendia que a beleza nunca é totalmente absorvida se ela não for observada com seu direto oposto. E em minha frente, eu via a ternura e o sexo. A complementariedade das duas me fizeram enxergar o que havia de mais complexo no meu ser Homem. Estava completamente absorto e, com impressão de que jamais teria uma ventura como essa, devorei o momento, na procura de saciar a descoberta de meu falo e meu coração.
Acendi o cigarro amassado que repousava em minha boca, tragando tão profundamente a fumaça que, quando a soltei, envolveu as duas mulheres do outro lado da mesa, que conversavam incessavelmente. Eram belas talvez demais para este velho gato.
Aquela da esquerda, Anna Paula, ergueu sua caneca pesada e tomou um gole do restante de cerveja que ainda havia lá, provavelmente quente e sem gás. Imaginei o gosto que aquilo produzia e tive vontade de conhecê-lo naquela boca cigana. Anna era, sem dúvida, a mais atraente dentre as duas. Traguei mais uma vez meu cigarro. Toda minha atenção sexual se voltava à ela. Reparei em suas sobrancelhas negras esticadas no rosto, que a conferiam um olhar furtivo e sedutor; não tive dúvidas de sua descendência latino-espanhola; Percorri meus olhos em seus cabelos desfiados, que escorriam bagunçados em seus ombros, numa demonstração de sua selvageria. Sua boca era perfeitamente desenhada e avolumada; os lábios estavam molhados da cerveja e contornavam seus dentes grandes e brancos.
(Mas que a beleza infindável daquele corpo me perdoe, o que nela me despertava tanta atenção eram as saboneteiras que repousavam em seus ombros. Só os poetas entenderão os profundos desejos que despertam em um homem duas saboneteiras bem-feitas.)
Embora desejasse percorrer cada centímetro de Anna Paula, a verdade é que, de alguma forma que eu não compreendia, me sentia completamente devoto à Camila. Ela escutava com atenção sua amiga falar alto, despejando sensualidade sobre sua meiguice. E mesmo que a conversa não a deixasse totalmente a vontade, tinha um sorriso quase preso no rosto e olhos atenciosos. Quem sabe fossem os olhos. Ela também, de tempo em tempo, me dirigia um olhar carinhoso que eu sentia dizer que me queria muito bem. Era descendente de irlandeses e talvez por isso tinha as bochechas rosadas. Ou talvez tivesse bebido demais. Mas eu recusava pensar naquela mulher tragando qualquer diabo. Se nela houvesse guardado algum escárnio ou maldizer, tenho certeza de que estes voltariam em formas puras como versos de uma amiga trovadora e devota. Tudo que eu pensava é que tinha em Camila uma mulher inalcançável que esbanjava tesouros; com seu jeito nórdico mas acolhedor: olhos que, com sua imensa ternura, me guardavam uma armadilha. Era impossível ficado ao lado dela sem se sentir fisgado. Não tive dúvida de que eram os olhos...
E quem diria, um gato velho e perdido como eu, tinha defronte a mim a imagem de uma mulher completa e endeusada. Anna Paula e Camila me lançavam olhares e eu compreendia. Compreendia que a beleza nunca é totalmente absorvida se ela não for observada com seu direto oposto. E em minha frente, eu via a ternura e o sexo. A complementariedade das duas me fizeram enxergar o que havia de mais complexo no meu ser Homem. Estava completamente absorto e, com impressão de que jamais teria uma ventura como essa, devorei o momento, na procura de saciar a descoberta de meu falo e meu coração.
90 anos de Kerouac
2008 foi o ano em que eu, pela primeira vez, entrei em contato com a Geração Beat e Jack Kerouac se tornou meu guia pelo mundo maravilhoso da contra-cultura.
No entanto, quando eu peguei On the Road nas mãos, na única versão disponível pela LP&PM Pocket, não imaginava o quanto eu mudaria depois de lê-lo. Percorri os poemas de Ginsberg, contos de Bukowski, mas nada me atraiu tanto quanto a prosa de Kerouac e suas personagens. É bem verdade que a estrada, afinal de contas, não salva ninguém. O epicurismo não é a chave para a completa libertação. Jack Kerouac sabe bem. Mas não se trata disso. Depois de ler e reler On the Road tantas e tantas vezes, eu finalmente adotei Dean Moriarty como um de meus guias espirituais. Aquelas páginas guardadas no meu velho livrinho amarelo me ensinaram, como ninguém poderia ter feito, a diminuir meus preconceitos e admirar de forma mais humilde as pessoas que me cercam. Tentei de alguma forma olhar pelos olhos de Dean, me perguntando diariamente: "O que Sal e ele fariam?"; E afinal, meu engrandecimento foi tamanho que creio que não há mais volta.
O nome dos grandes homens não morrem com seus corpos: ressoam por uma eternidade, deixando um sopro de vida que engrandece-nos com suas obras.
Meus parabéns, Jack, onde quer que você esteja.
"E eu me arrastava na mesma direção como tenho feito toda a minha vida, sempre rastejando atrás de pessoas que me interessam, porque, para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo. Agora, aqueles que nunca bocejam e jamais falam chavões, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício, explodindo, como constelações em cujo centro fervilhante — pop — pode-se ver um brilho azul e intenso."
No entanto, quando eu peguei On the Road nas mãos, na única versão disponível pela LP&PM Pocket, não imaginava o quanto eu mudaria depois de lê-lo. Percorri os poemas de Ginsberg, contos de Bukowski, mas nada me atraiu tanto quanto a prosa de Kerouac e suas personagens. É bem verdade que a estrada, afinal de contas, não salva ninguém. O epicurismo não é a chave para a completa libertação. Jack Kerouac sabe bem. Mas não se trata disso. Depois de ler e reler On the Road tantas e tantas vezes, eu finalmente adotei Dean Moriarty como um de meus guias espirituais. Aquelas páginas guardadas no meu velho livrinho amarelo me ensinaram, como ninguém poderia ter feito, a diminuir meus preconceitos e admirar de forma mais humilde as pessoas que me cercam. Tentei de alguma forma olhar pelos olhos de Dean, me perguntando diariamente: "O que Sal e ele fariam?"; E afinal, meu engrandecimento foi tamanho que creio que não há mais volta.
O nome dos grandes homens não morrem com seus corpos: ressoam por uma eternidade, deixando um sopro de vida que engrandece-nos com suas obras.
Meus parabéns, Jack, onde quer que você esteja.
"E eu me arrastava na mesma direção como tenho feito toda a minha vida, sempre rastejando atrás de pessoas que me interessam, porque, para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo. Agora, aqueles que nunca bocejam e jamais falam chavões, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício, explodindo, como constelações em cujo centro fervilhante — pop — pode-se ver um brilho azul e intenso."
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segunda-feira, 5 de março de 2012
E enterrou-se em um desespero silencioso. Incapaz de sucumbir, apenas escutava. E repetia, em sua mente, cada palavra, com a entonação apropriada, morrendo a cada instante e imensamente.
Levantou a cabeça e desejou chorar. Mas por seus olhos parecia apenas passar um vento cortante, que levaria suas lágrimas embora e não permitiria gozar de uma dor líquida e errante.
A dor parecia ter se instalado como um vírus persistente, que não tarda em se reproduzir e causar mais febre.
Morria. E que dor imensa de morrer tão imensamente que se continua vivendo.
Levantou a cabeça e desejou chorar. Mas por seus olhos parecia apenas passar um vento cortante, que levaria suas lágrimas embora e não permitiria gozar de uma dor líquida e errante.
A dor parecia ter se instalado como um vírus persistente, que não tarda em se reproduzir e causar mais febre.
Morria. E que dor imensa de morrer tão imensamente que se continua vivendo.
sábado, 25 de fevereiro de 2012
Tanque de Foguete
E quem diria
que realmente viria
Abrupto este dia
Dona Maria chegou junto
na janela e
Benzadeus!
Que troço é esse
que não tem cara de bicho
nem tem cara de homem
e também não dá pra servir
no almoço das criança?
Seu Zé foi armado
e seu batalhão ao seu lado,
O cachorro e o menino do machado.
E na terra onde nem mosca se move
Quem sabe a terra toda foi movida
Por um terremoto?
Um grupo de gado
Que quem sabe estava perdido?
"Quem sabe".
Mas foi o João da Vila que viu
O mistério de metal
Abraçado à terra,
Como se tivesse vindo uma bomba
que inicia uma guerra
Que vem lá do céu!
E Rosana que não tarda
E arde sempre uma boa fofoca
Chamou os Homens
e eles vieram:
Empacotados em seus ternos,
Vieram.
- Deixa disso, Rosana!
É coisa de É-TÊ,
Tem que jogá bem longe da Terra,
Chama os homi não.
- Deixa disso, ô João!
Vem os homi pra cá
Faz o que tem que fazer
E a gente aparece na tevê!
E o mistério navega sem dificuldades
Pela aridez do sertão,
Despertando qualquer intriga
Pelas terras de seu João
Mal sabia o homem,
Que guerra com E.T. não era,
mas sim um pedaço
do que aproximara o Homem
Um pouco mais do céu.
que realmente viria
Abrupto este dia
Dona Maria chegou junto
na janela e
Benzadeus!
Que troço é esse
que não tem cara de bicho
nem tem cara de homem
e também não dá pra servir
no almoço das criança?
Seu Zé foi armado
e seu batalhão ao seu lado,
O cachorro e o menino do machado.
E na terra onde nem mosca se move
Quem sabe a terra toda foi movida
Por um terremoto?
Um grupo de gado
Que quem sabe estava perdido?
"Quem sabe".
Mas foi o João da Vila que viu
O mistério de metal
Abraçado à terra,
Como se tivesse vindo uma bomba
que inicia uma guerra
Que vem lá do céu!
E Rosana que não tarda
E arde sempre uma boa fofoca
Chamou os Homens
e eles vieram:
Empacotados em seus ternos,
Vieram.
- Deixa disso, Rosana!
É coisa de É-TÊ,
Tem que jogá bem longe da Terra,
Chama os homi não.
- Deixa disso, ô João!
Vem os homi pra cá
Faz o que tem que fazer
E a gente aparece na tevê!
E o mistério navega sem dificuldades
Pela aridez do sertão,
Despertando qualquer intriga
Pelas terras de seu João
Mal sabia o homem,
Que guerra com E.T. não era,
mas sim um pedaço
do que aproximara o Homem
Um pouco mais do céu.
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
(Ainda que meu amor e minha capacidade de compaixão tivessem limites e eu não os pudesse oferecer à todo ser que me cativa, eu o devotaria, completo e sem limites, exclusivamente a você)
E a menina
que insiste e diz
que ama tanto a natureza
Bastou pousar a Borboleta
em sua cabeleira
Que saltou urrando:
"Afasta de mim
essa absurda
estranheza!"
que insiste e diz
que ama tanto a natureza
Bastou pousar a Borboleta
em sua cabeleira
Que saltou urrando:
"Afasta de mim
essa absurda
estranheza!"
Quero te dar
Quero te dar o momento em que você nasceu em mim como uma guerra
e eu, fraco e sem munição, fui vencido sem esforço por você;
E quero te dar o momento seguinte em que, sem forças nem ao menos para erguer
a bandeira da derrota, te deixei me invadir,
e assim me cedendo, você nasceu em mim com a suave e tranquila
paz em mim mesmo...
e eu, fraco e sem munição, fui vencido sem esforço por você;
E quero te dar o momento seguinte em que, sem forças nem ao menos para erguer
a bandeira da derrota, te deixei me invadir,
e assim me cedendo, você nasceu em mim com a suave e tranquila
paz em mim mesmo...
sábado, 7 de janeiro de 2012
Sobre a mentira.
Tudo começou com uma grande mentira. E quem diria: a mentira, quando bem dita, quando um tanto quanto repetida, quando bem temperada e reforçada a cada dia, com o esforço e a hipocrisia de quem não quer - mas que inconscientemente deseja que sua mentira se perpetue -
se torna então uma verdade, que aos poucos se incorpora, se assimila seu conteúdo, como se fosse seu e como se sempre tivesse sido real.
A mentira, então, naturalmente se porta como uma novidade, igual àquela que originou a mentira, tornando o que não era possível de ser racionalmente vivido, em algo confortavelmente tragável.
No entanto, a mentira estrangula seu criador, aos poucos, por não ter sido criada como uma filha natural, mas como a adotada.
A mentira, assim, reaparece, hora ou outra, de cara nova, acompanhada da dor de uma descoberta frustrante, que obriga que a realidade seja tão triste; enquanto obriga que a mentira, arquitetonicamente planejada por uma vontade tão verdadeira, seja, afinal, tão bela.
se torna então uma verdade, que aos poucos se incorpora, se assimila seu conteúdo, como se fosse seu e como se sempre tivesse sido real.
A mentira, então, naturalmente se porta como uma novidade, igual àquela que originou a mentira, tornando o que não era possível de ser racionalmente vivido, em algo confortavelmente tragável.
No entanto, a mentira estrangula seu criador, aos poucos, por não ter sido criada como uma filha natural, mas como a adotada.
A mentira, assim, reaparece, hora ou outra, de cara nova, acompanhada da dor de uma descoberta frustrante, que obriga que a realidade seja tão triste; enquanto obriga que a mentira, arquitetonicamente planejada por uma vontade tão verdadeira, seja, afinal, tão bela.
quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
A paixão, como o desejo, são estritamente egoístas. Como se houvesse uma barreira entre você, persona, e o objeto, que devesse ser abrupta e imediatamente destruída. É a vontade da posse incessante, sem razão alguma, apenas guiada pela própria existência dessa vontade. A paixão é como um ser novo que brota n'alma da gente, que está louco por devorar e se multiplicar; como um selvagem, um bruto.
O amor, porém, é o sentimento divino. É todo classe e requintamento: o amor surge com a paz e a razão, e não pretende se apossar do objeto amado. Muito pelo contrário, o amor é o nível em que se alcança a liberdade suprema, em benefício próprio e de outrem. O amor não pretende se não cuidar, adorar e admirar.
O mais perfeito da Natureza é que ela, apesar de nos ter feito bichos, plantou para germinar, em cada homem, a semente do amor, que nos separa do nível da bestialidade e nos aproxima um pouco mais dos deuses.
O amor, porém, é o sentimento divino. É todo classe e requintamento: o amor surge com a paz e a razão, e não pretende se apossar do objeto amado. Muito pelo contrário, o amor é o nível em que se alcança a liberdade suprema, em benefício próprio e de outrem. O amor não pretende se não cuidar, adorar e admirar.
O mais perfeito da Natureza é que ela, apesar de nos ter feito bichos, plantou para germinar, em cada homem, a semente do amor, que nos separa do nível da bestialidade e nos aproxima um pouco mais dos deuses.
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