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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Ai!, ora
Como quero um pouco de monotonia
um pouco a mais de tempo
Um pouco de tédio pros ponteiros
do meu relógio de pulso!
Suplicaria por menos abas
menos janelas
menos amores

Não quero mais esse caos
Quero que o sangue dentro de mim tenha mais calma
Meu coração para bater mais devagar...
Tire de minha frente essa coca e esse café!
Canso e agito.

Quero ver a vida devagar
Quero notar e notar e notar a vida passando
Bem devagarinha
Em frente e dentro de mim!

Se ao menos tivessemos mais tempo
como diria o poeta - poderiamos fazer
uma poesia direita
nossos versos nao seriam mais belos,
seriam inteiros
não seriam qualquer anotação fosca
cópia esdruxula de nossos amantes
seria redonda e aguda
como nossos desesperados sentimentos

Quero a vida devagar;
Dê-me a triste vida perpétua dos poetas!
Quero uma tarde inteira e um verso de uma palavra
Chega, BASTA! a esse caos que alimenta minha apatia

Quero a vida tão devagarinha...

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A Arte não se contenta com sua plena existência. Ela é um enorme auto-falante que implora para ser escutada. Mas não apenas: quer ser apalpada, degustada, cheirada profundamente. Ela suplica por orgias e não se aborrece com nada. Porque arte é o aborrecimento e o desejo. É o motor humano.
Se a vida fosse como o cinema, seria mais bela e nós mais alegres. Mas enquanto o modelo de cinema for o americano, viveremos uma mentira partidária e uma desilusão romântica.

À Luz da Tradição

Sento-me em frente ao computador e começo a escrever. Enquanto minha reflexão sobre tudo que me cerca é exclusivamente íntima e pessoal, os meios dos quais faço uso para encaminhar os pensamentos são inúmeros e me servem de pronto.

Baseados na importância da era do computador e da tecnologia de exata presteza, surge uma idéia do Common Core Stated Standarts Iniative de abolir a letra cursiva do ensino, substituindo-a pelo computador. Esta não passa de um impulso e uma assinatura no papel de algo que já vem incorporando a sociedade contemporânea há algum tempo: a substituição da tradição pelo que há de mais moderno e usual.

Muito embora faça uso de todos os recursos que tenho disponíveis, não me acode a memória um momento em que me senti prejudicada por usar a letra cursiva, a lápis e a papel. Pergunto-me então por que uma instituição importante, de ação conjunta de 46 estados americanos, decidiria por aboli-la. Dificuldade? Mercado? Falta de métodos de ensino?

Digo então o óbvio: É comum a vontade de acabar com aquilo que não se entende ou tem-se dificuldade. Alunos e professores, sentindo-se prejudicados com aquilo que ensinam e são ensinados, procuram meios mais parcimoniosos. Mas não enxergo nisso um grande motivo. Afinal, o ganho com a escrita à mão é maior do que o prejuízo.

A escrita ajuda o aluno a desenvolver seu senso crítico, avaliando com mais calma e cuidado aquilo que lê e escreve; e muito além: ajuda a construir seu intelecto e moldar o raciocínio – bem como a matemática, que embora seja de pessoal desagrado, serviu-me como instrutora do mundo lógico. Não apenas, mas a escrita é um meio de identificação pessoal, é a primeira criação de um aluno, a primeira externalização de seu mundo em desenvolvimento.

Termino meu texto, enfim, no papel, à mão. E, agradecida pela bênção de compartilhar do mesmo método de escrita que Machado de Assis e Guimarães Rosa, deixo minha pequena criação descansar à luz da tradição.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Na penumbra de suas palavras eu fiquei
E expremeu as palavras que lhe foram oferecidas, como quem quer extrair dela a suma verdade.

Stay Hungry. Stay Foolish.

A vida é mesmo coisa muito frágil. É por isso que está sempre chegada nas ironias.

***

Eram quase dez horas da noite. Minha mãe estava ao telefone com meu pai, enquanto eu, no meu quarto, pude ouvi-la dizer: "Você viu a notícia? É. Eu também vi. Fiquei com pena dele.". Algum tempo atrás, tive minha primeira experiência com a morte. Creio que, desde então, minha percepção auditiva ficou melancolicamente apurada: As palavras quando carregam algo além de seu sentido convencional, pesam na garganta de quem fala.   Com um pouco de medo da resposta, perguntei: "Que aconteceu, mãe?". E quem respondeu de prontidão foi minha irmã: "Steve Jobs morreu, você não viu? Tá em todos os noticiários."

Aquelas palavras, como de costume quando se ouve alguma notícia ruim, ficaram ressoando na minha cabeça. E por alguns instantes, tudo que ouvia era "Steve Jobs morreu". Steve Jobs morreu. Steve Jobs morreu. Steve Jobs. Morreu. E como quem por epifania se dá conta de algo, me deparei com meu celular em minha frente. Um iPhone. Acredito que eu nunca me esquecerei desse momento. A vida é mesmo cheia de ironias. Pensei então em todas as pessoas que também, por ironia, ficaram sabendo da notícia por um celular da Apple. Por um tablet da Apple. Por um computador da Apple. De alguma forma todos nós estávamos conectados, mas não por uma marca. Por algo que indubitavelmente é maior do que o símbolo da maçã e a que, sem sombra de dúvida, deveríamos agradecer: Steve Jobs.

***

Por muito pouco não entendi, de fato, do que se tratava a figura de Steve Jobs. Eu, que na época da explosão dos mp3 no mercado, desejei arduamente um iPod, nunca tive sequer interesse na história da marca da maçã; e acredito que muitos dos que desejavam, também não o tiveram. Muito embora, mais ou menos nessa época - entre 2005 e 2006 - Steve Jobs discursasse para uma turma de formandos em Stanford, expondo sua história e valores. Steve Jobs não foi apenas um gênio da tecnologia, mas seu talento transcendeu nossa época e ambições. E o discurso - o qual eu só fui ter verdadeiro contato meia década depois - me tocou de tal forma que nunca esqueci, como tenho certeza de que nunca esquecerei, suas últimas palavras: Stay hungry. Stay foolish.

Jobs, como muitos devem saber, é filho de pais adotivos. E dentro de uma garagem, fez, com um amigo, o primeiro computador da marca que mais tarde receberia o nome de Apple. O homem, que muitos dizem ser o maior gênio da atualidade, nunca se formou. Nunca teve um ensino completo. E mesmo assim, construiu um legado cultural para o mundo contemporâneo imensamente vasto.

Mas não é do Steve-Jobs-da-Maçã (nem da Pixar) que eu quero comentar. É de um ser humano chamado Steven Paul Jobs, que reconhecia no conhecimento uma forma de sobrevivência e ganhar a vida. Em uma de suas frases mais famosas, dizia:"Again, you can’t connect the dots looking forward; you can only connect them looking backwards. So you have to trust that the dots will somehow connect in your future. You have to trust in something–your gut, destiny, life, karma, whatever. This approach has never let me down, and it has made all the difference in my life." De alguma forma, reconheço nesse homem a grande ironia do século XXI. Uma vez que ele, enquanto batalhava, com a imensa vontade de virar o jogo, formava seu batalhão da Apple, a grande maioria dos jovens do mundo contemporâneo vem seguindo o sentido oposto de Jobs: Enquanto preguiçosos, na procura de uma vida parcimoniosa e sem grandes esforços, desejam cada vez mais, fazendo cada vez menos. Somos nós esses mesmos jovens que desejamos os produtos da Apple, sem reconhecer seu valor, ou sem nos esforçarmos para isso.

Vivemos uma época de grandes heroísmos. Sentamos e esperamos um milagre, o qual sem dúvida nos salvará e nos fará ganhar sucesso e reconhecimento. Enquanto isso, admiramos aqueles que, por esforço, nos  promovem o conforto e a alta tecnologia a rápido alcance. Quanto a isso, sim, Steve Jobs pode ser considerado um herói do século XXI. Mas muito mais pela aparência do que como um mestre definitivamente talentoso.

Creio que, enfim, minha verdadeira tristeza e frustração ao saber que Jobs havia falecido vem de sua determinação de lutar contra o câncer, que, afinal, resume sua perseverança ao longo de toda a vida. O homem, seja qual for, por mais afinco e amor que tenha, hora ou outra, é vencido. Ironicamente.

***

Por último, gostaria de fazer uma breve observação aos pedantes de plantão. Não foi uma única vez que me deparei com comentários do tipo "Um homem morre, milhões choram. Milhões de homens morrem, ninguém chora.", referindo-se à Jobs e a crianças africanas. Creio que estamos confundindo os departamentos e estamos nos preocupando demais com moralismos desnecessários - fora o gasto de energia com uma falsa preocupação que poderia ser canalizada para a Mudança. Enfim, como é um breve comentário, digo apenas que acredito que existem duas formas de melhorar o mundo: Acaba-se com o que há de ruim ou aperfeiçoa-se o que há de bom.

Paz, Steve Jobs.

sábado, 8 de outubro de 2011

Ai!
Como queria que
o hálito da loucura
preferisse outrem

E não quisesse
apodrecer
em minha boca.
Se Machado de Assis, quando homem, tivesse algum defeito, eu não hesitaria em renunciar todas minhas virtudes para a este acolher.
E nos amamos debaixo dos lençóis feito uma máquina a vapor, que por final emperra e explode, mas que, como não se espera, só assim dá se por feita sua criação.
Nunca tinha parado para pensar que festas de Natal poderiam, afinal, significar mais do que uma reunião em que a família se junta para beber e comer.

Estávamos todos nós, nossa imensa família, reunidos em uma sala pequena, do humilde aposento de minha tia. Estávamos todos bêbados e com nada no estômago; e enquanto a comida apenas deixava seu cheiro sedutor no ar, babávamos com a alma, morrendo de fome. Quietos.

Meu tio Raul estava especialmente mais quieto que os demais, encostado ao lado de uma prateleira empoeirada, onde ficavam as garrafas de vinho. Foi quando olhei pra ele, que me olhou também e retribuiu com um modesto sorriso, o suficiente pra entortar suas rugas na bochecha. Voltou a encarar o carpete, perplexo com não se sabe o quê. Começou então a balbuciar algumas coisas; ninguém ligava, estavam todos muito bêbados. E mesmo quando se fez completo silêncio, só eu tentei ouvir o que o homem dizia. Começou falando sobre bicicletas e corridas. Ninguém entendia nada. Porém, o entretenimento da minha noite era conseguir captar a essência de suas palavras.

"O importante mesmo é não parar. Apesar de tudo. Não importa se você prefere correr e logo descansar quando o Final chegar ou se você prefere ir devagar e devagar na espera por um lugar para se chegar, mesmo que esse não exista. Cada um com seu ritmo. O importante é não parar. E veja só todos nós aqui reunidos nessa belíssima comemoração, nos amando, correndo léguas de linhas de pensamentos, juntos. Sim, o importante é não parar..."

O Natal não rendeu e acabou chegando a terça-feira. Mas o que era realmente importante... era continuar. Porque tudo, absolutamente tudo, segue seu fluxo, sempre continuando, sem parar. Se os astros não param, girando em suas órbitas, por que deveríamos nós?